Café

anonymous couple at cafe table with blooming roses and coffee

As pessoas não reparam em nada. Entramos num café, contornamos as mesas limpas e postas, com a ementa, vasinhos para os guardanapos ou para o açúcar, adoçante ou paus de canela, e seguimos até ao primeiro lugar livre. E ignoramos que não há serviço de mesa.

Cheirei o café e consumi-o sem o beber. O vapor espalhou-se pela mesa e isolou-me da minha companhia. De repente, vi-me sozinho. As conversas na sala chegavam-me como bzz bzz de moscas, mas a voz dela surgiu consistente e puxou-me de volta. Fitava-me por detrás da sua chávena. Oh não, já me acha um tolinho.
Disfarcei com o meu primeiro gole no café negro, amargo, forte. Devolvi-lhe o olhar e só conseguia pensar no que podia fazer por ela. No que podia fazer por ela? Dei outro gole para engolir a ideia.

“Não nos podemos ver mais” informou-me.
“Okay.” Pousei a chávena. Ela escondeu a cara na dela.

Senti-a a desaparecer por entre os balões de diálogos borrados dos outros clientes. Bebi mais um gole e enchi-me de pena. Lamento, mas café estava divinal.
Acabou por desvanecer mesmo à minha frente. Outra vez. Plural. Sumiu como um sopro da chávena quente.
Talvez se tivesse prestado mais atenção e reparado no mundo à minha volta, nada disto teria acontecido. Plural. Mas ela? Ela reparava em tudo.

O som voltou à sala. As conversas e os bateres metálicos das colheres ou das canecas na madeira. Os passos para lá e para cá. Volto a beber.
O café desperta a mente: fazia-me filosofar que nem um bêbado de bairro com um pacote de vinho barato; nas linhas do líquido negro via duas pessoas. Uma delas a beber enquanto a outra falava e gesticulava. Estava a esforçar-se; a lutar por algo. Bateu com as palmas na mesa e saltou da cadeira para sair dali. Saiu tal e qual o café que iria sair dali a umas horas – de forma explosiva.
Que sorte, o fumo do café escondeu-o da vergonha, mas ninguém reparou neles.
Acabei o meu café. Acabei o dela para não desperdiçar e porque o tinha de pagar e levantei-me para o balcão. Assim que o fiz, dois vultos foram assombrar a mesa. Paguei e saí para o frio.
As relações começam como uma chávena de café. Quentes; recíprocas, fortes e sem açúcar. Há quem arrisque e bote uma colher. Mas depois… arrefece e ficam as borras no fundo. Pagamos cinquenta cêntimos por um, mas uma relação custa tempo. E muito pode acontecer durante esse tempo.

São servidos?